Que a comunicação move a humanidade, todos nós sabemos. O
poder da palavra é imenso, pois é a partir dela que as ações do homem se
integram e dão vida a sociedade. A transmissão de conhecimento por meio da
comunicação, nas suas mais diversas formas, foi identificada como fator
preponderante para o avanço do ser humano, e desde então há investimento maciço
nos meios de agilização e amplificação da mesma. Os recursos - naturais ou não
- que o homem usa para se relacionar com seus semelhantes são alvo de constante
evolução, visando sempre mais e mais rapidez, independente do tamanho da
mensagem a ser veiculada.
Tal visão, além de óbvia, é até simplória para descrever o
grau de integração da humanidade hoje. Com o mundo unificado pela Internet, são
inúmeros os meios disponíveis para a comunicação, encurtando enormemente
distâncias e reduzindo o fator tempo. Entretanto, não é raro ver que certos
avanços tecnológicos trazem consigo efeitos colaterais, muitas das vezes
difíceis de serem combatidos. O marco zero desse “boom” parte da já citada
Internet, tendo efetivamente um acesso mais popular e global com os meios
portáteis, como smartphones e tablets. Tonar “deslocáveis” os recursos antes
amarrados aos PC´s e proporcionalmente ao Notebooks era o “pulo do gato” que
faltava. Curiosamente, estes últimos eram idolatrados, quando do seu
lançamento, como a solução à imobilidade dos PC´s, mas bastou telefones
assumirem suas funções para estes também passassem a ser classificados como inconvenientes
neste quesito e a “pesar” na mão das pessoas.
Depois dessa reflexão, fica fácil de entender que o
personagem central dessa história é o celular, que apesar caráter facilitador,
complicou muito em outras coisas. O comportamento das pessoas, com a chegada
deste “brinquedinho”, simplesmente foi virado de cabeça para baixo. E não é
exagero, bastando um rápido olhar a sua volta: é engraçado como nosso povo
sempre foi aberto à modas, quaisquer que fossem, ainda que o celular não possa
ser encarado como moda. Trata-se de uma revolução tecnológica importantíssima,
mas que não tardou a tomar ares de moda por conta de questões como inclusão
social e como medida de status. Isso sem mencionar seu poder de convergência,
ao agregar funções: basta lembrar que ele conseguiu derrubar um equipamento que há pouco conseguiu
se reinventar e se popularizar, a boa e velha máquina fotográfica. Tão logo o
filme deu lugar ao digital, estas caíram no gosto do povão, mas o celular
acabou com a festa, fazendo tão bem o que elas faziam e com muito mais
possibilidades, como programas de edição de fotos, por exemplo. Outro
equipamento, mais novo que as máquinas digitais, mas que também sucumbiu
perante nosso amigo celular foram os players de MP3 (que explodiram no mundo
graças a Apple, via IPOD). Hoje, também têm suas funções incorporadas a gama de
talentos de qualquer smartphone.
Ainda que de maneira resumida, está aí a explicação desse
sucesso. O problema é o aspecto psicológico da questão, centrada no fato de que
o dia a dia das pessoas agora gira em torno do celular. Esquecer o celular em
casa, por exemplo, é algo que afeta de maneira significativa a rotina das
pessoas. Fazer ligações telefônicas de maneira móvel é a premissa básica desses
aparelhos, mas a verdade é que a grande gama de recursos, somada ao poder de
conectividade, nos torna escravos deles: redes sociais, agenda, fotos,
documentos, jogos, música, vídeos, TV, tudo está lá e nos serve em algum
momento do dia. Os mais jovens então, hoje inseridos num contexto social muito
mais virtual do que pessoal, são os mais afetados, tamanha a dependência que
vemos hoje. Eles, na sua esmagadora maioria, não querem possuir um telefone:
querem algo que lhes dê status e inclusão em seu círculo social, algo que em
outras gerações era obtido por meio do vestuário, por exemplo.
Entretanto, de um modo geral, esta inclusão social
proporcionada gera um efeito colateral: a dispersão (social). As pessoas usam
todo o seu tempo livre, independente do lugar (atenção a isto), enfiadas nos
seus mundos particulares, cujo portal de entrada é o celular. O comportamento
das pessoas foi afetado de tal maneira que para onde se olhe tem alguém absorto
na tela de um deles. Com isso, a comunicação presencial cada vez mais cede
espaço para a comunicação virtual, o que no fim de tudo, afasta as pessoas.
Além disso, outros desvios comportamentais negativos surgem: pessoas em pé em
ônibus pondo em risco sua segurança em ocupar uma das mãos para usar o celular;
falta de educação ao tentar usá-los em ambientes lotados, como o Metrô na hora
do rush; toques altos e inconvenientes, passando por jogos e músicas sem uso do
fone de ouvido, isso mencionar a indelicadeza de manter o aparelho ligado a até
mesmo atende-lo em reuniões, salas de
aula, teatros, cinemas, em desrespeito aos demais e etc. Outro efeito nefasto é
a dependência de checar a todo o momento redes sociais e congêneres, chegando a
um ponto de vício em alguns casos, por incrível que pareça. Resumindo, o
celular “come” o seu tempo, num apetite que parece não ter fim.
Por último, acho importante mencionar o aspecto evolutivo e
econômico. Os avanços tecnológicos hoje têm ritmo acelerado, e
eletro/eletrônicos estão bem no centro desse processo. O lançamento de hoje é o
obsoleto de amanhã, mas mesmo assim as pessoas tentam acompanhar este ritmo. Independente
dos valores altos frente aos aparelhos e seus recursos, as pessoas não medem
esforços para adquirí-los, mesmo que não haja a necessidade de compra, apenas
de satisfação pessoal e do senso de modernidade que a sociedade prega. Em
Marketing, é o chamado duelo entre a “necessidade” e o “desejo”: pode não haver
a necessidade em si, mas a mídia bombardeia e imputa que você precisa
(necessita) daquilo, criando-lhe um desejo de compra praticamente irresistível.
Completando o processo, o reconhecimento de status social que aquilo lhe dá
reforça a decisão de compra, mesmo sem necessidade. No fim das contas, o modelo
de ontem ainda funciona, só ficou velho cedo.
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